Celebração e festa: 52 anos do Centro Cabocla Anay
Receber convite dos terreiros para participar
dos toques semanais, de atividades do calendário anual e de eventuais
programações nas diferentes casas religiosas sempre aconteceu e deixa-me
honrado. Procuro ser presença, com respeito e admiração que sempre permearam minha
atividade de pesquisador ao longo de anos de encontros, trocas de conhecimentos
e aprendizagem com as comunidades de terreiro. Por esses dias, um convite me
chamou atenção por partir de uma senhora de quase noventa anos de idade – madrinha
Aldelícia, como é mais conhecida e que dirige com uma vitalidade invejável um
centro de umbanda no bairro das Quintas, a mais de cinco décadas.
A mensagem recebida, escrita por sua
filha, dona Margarete, informava a organização de “uma farta mesa de frutas
para os caboclos” e destaca que gostaria que eu pudesse imensamente participar
do toque de caboclos. Os últimos dias tinham sido cheio de atividades e
atropelos do cotidiano. Não estava bem de saúde, já passava da hora e resolvi
seguir para o Centro. O toque tinha começado. Entrei no salão procurando não
chamar atenção e me sentei na parte final onde as pessoas estavam, mas dona Aldelícia
imediatamente me chamou para sentar em um lugar mais perto dela, o que atendi
prontamente.
Não tinha ideia da programação, além do
que estava escrito na mensagem. Sempre me emociono com a relação que as casas têm
com a jurema. Nessa noite pude ver um bailado de caboclos e um ponto para caboclinhos
muito especial. Mas não imaginava a surpresa e emoção que ainda estava para vir
na celebração.
O Centro
Espírita de Umbanda Cabocla Anay reuniu sua comunidade para celebrar os 52
anos de existência, conforme documento de certidão de registro dos estatutos do
Centro no Primeiro Ofício de Notas da cidade do Natal em 21 de agosto de 1973, exposto
em um quadro no salão principal do Centro, embora já estivesse em funcionamento
desde o início desta década. Considerando o histórico das dificuldades enfrentadas
pelos espaços religiosos afro-brasileiros no seu cotidiano, torna-se
significativo celebrar cinco décadas, é mais que resistência, é afirmar vida, memória,
tradição, pertencimento.
O Centro foi fundado pela Yalorixá Aldelícia Araújo (88 anos de
idade) e seu esposo José, já falecido. Iniciam as atividades religiosas na sala
de sua residência, posteriormente transferidas para o espaço religioso
construído na Travessa Campos Limpos, onde se encontra desde então. Anteriormente,
dona Aldelícia passou pelo centro do babalorixá Tenente Barroso onde fez sua
iniciação.
Para a programação da noite, o amplo
salão do Centro tinha sido preparado cuidadosamente, decorado com flores e
folhas em que a cor verde predominava, inclusive, na indumentária das saias
longas das mulheres que participavam da gira. O salão respirava vida, estava
bonito. As 18h45, conforme divulgado tem início o toque dos tambores, saudando
Ogum e os caboclos, em especial a cabocla que dar nome ao terreiro, Cabocla
Anay. A yalorixá visivelmente emocionada agradece as entidades e a todos de sua
comunidade pela longevidade da casa e de poder ajudar aos que a procuram. Os
tambores voltam a soar acompanhados pela voz dos participantes. Saúdam a
jurema, tocam em um belíssimo tom, um ponto para os caboclinhos. Alguns caboclos chegam a terra. A Cabocla
Anay não poderia faltar e ao se fazer presente, pede de imediato que o cocar
seja colocado em sua cabeça. Passa a circular no salão, saúda individualmente
todos os presentes, passando os maracás sobre a pessoa; brinca com uns, indica
certos cuidados a outros, reforça melhoras na saúde. Nessa caminhada, em um
dado momento, recebe de uma das mulheres, um buquê de flores.
Uma toalha na cor verde é colocada no
chão da parte central do salão e sobre ela dispõem frutas – melancia, melão,
banana, goiaba, uva, banana, fartamente distribuídas e saboreadas pelos
participantes. O banquete das frutas é complementado com um lanche também
distribuído com todas as pessoas. Um bolo com a inscrição do tempo é
apresentado e acompanhado de cântico de parabéns.
Antes de encerar as comemorações, a secretária fez a leitura de uma mensagem na qual lembrava os objetivos do Centro e destacou a importância de alguns membros que tinham se passado para outro plano. Comunicou que uma portaria coletiva tinha sido emitida, conforme o estatuto do Centro, concedendo o Mérito Umbandista para algumas pessoas, sendo considerado o tempo de permanência no quadro do Centro. Foram agraciados com o Diploma 17 pessoas, situadas numa escala entre 11 e 44 anos de pertencimento ao Cabocla Anay. Foi ainda concedido um Diploma de Honra por reconhecimento e homenagem a um não membro do Centro. Isto realmente foi a grande surpresa. Também foi emoção, mas, sobretudo, honraria.
Belíssimo depoimento professor. É uma honra estar e ser convidado para esses espaços, reflete o respeito que o senhor cultiva entre estas comunidades. Parabéns ao senhor e ao Centro Cabocla Anay
ResponderExcluirExcelente depoimento, professor!
ResponderExcluirLindo relato!!
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirDepoimento cheio de afeto. Maravilhoso, professor! Mal posso imaginar a emoção. Meus parabéns ao Centro!
ResponderExcluirParabéns, amigo; pelo relato que você fez, o respeito e o profissionalismo!
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