sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Religião e política: a eleição para vereador em Natal

A relação entre religião e política não é um fenômeno recente. Ao longo do processo histórico de formação da sociedade brasileira, essa relação foi visível e marcante, tendo principalmente como protagonista a igreja católica. Em anos mais recentes, o crescimento das igrejas protestantes, sobretudo àquelas ligadas a vertente pentecostal, têm ocupado espaços significativos, compondo blocos de poder cada vez mais forte em deliberações.    A presença de religiosos afro-brasileiros na política é bastante diferente, em decorrencia de diversos fatores relacionados ao processo histórico de formação da sociedade brasileira e a inserção da população negra nesta sociedade.

A recente eleição para vereadores no Brasil provavelmente não altera o quadro de forças políticas quando se trata de religião. No entanto, em relação ao pleito a câmara municipal de Natal, um fato chama atenção: a presença de candidatos ligados ao universo religioso afro-brasileiro – Sargento Regina, Dimas Carlos, Pai Freitas e Macilei. Embora o resultado em termos de votação não tenha sido marcante, é significativo refletir sobre a presença deles na esfera política. Desde 1992 (vinte anos), com a candidatura de Leonel Monteiro, na época presidente da FEURN, que faz uma campanha voltada para “a família umbandista”, que isto não acontecia.    
Entre os candidatos, Sargento Regina tenta reeleição buscando apoio em um campo que vai da corporação militar aos terreiros. Em seu primeiro pleito, basicamente a corporação a elege e a relação com os terreiros vai despontar durante seu mandato, seja nos discursos voltados para as populações discriminadas, seja na execução de ações, como as audiências públicas, promovidas para as comunidades de terreiros. Todavia questões como intolerância religiosa e sua ação legal, como a regularização fundiária das casas e o acesso ao registro documental, considerados fundamentais no contexto atual, não foram devidamente enfrentadas.      

Marcilei, também ligado a corporação policial, assume atualmente a presidência da Federação de Umbanda e Candomblé do RN. Faz uma campanha sem muita repercussão e pouca articulação entre os terreiros. Dimas Carlos, produtor cultural e bailarino, com iniciação na religião e ligado a uma determinada casa religiosa, procura abarcar os grupos artísticos por onde circula. Pai Freitas faz uma campanha através de visitas aos terreiros, com um discurso que enfatiza seu compromisso com a religião e os seguimentos disciminados socialmente.  
Além de estarem ligados ao universo religioso afro-brasileiro, esses candidatos tem em comum o fato de realizarem uma campanha sem recursos financeiros e estrutura organizacional. Mas nos limites desta reflexão é possível ressaltar outras dificuldades enfrentadas, como a falta de uma plataforma de conteúdo que especifique o que se deseja para o universo religioso e as comunidades de terreiros.  Ou seja, concretamente, enquanto vereador, qual será seu papel na relação com o segmento religioso afro-brasileiro.  

Outro ponto que parece perpassar os candidatos é a ausência de uma militância política sistemática nas comunidades de terreiros. Eles possuem relações com os terreiros, são religiosos, mas a presença enquanto ação política é novidade. E um ponto, não menos importante, é a visível falta de articulação entre os terreiros (que ganha forma no registro de 4 candidaturas). Nesse caso, nem os candidatos conseguiram tecer esta articulação, nem a população religiosa consegue perceber a dimensão de sua importância no contexto do terreiro. Essa desarticulação reproduz o que ocorre no cotidiano, fora da esfera política, as divisões e os conflitos, o que em ultima instância contribui para enfraquecer o grupo e seu possível poder político.  
Por fim é bom lembrar que a discussão sobre religião e política implica na reflexão sobre a visibilidade das religiões afro-brasileiras,  a construção de processos identitários, o assumir-se enquanto religioso em um contexto que exclui, discrimina, exigindo dos dirigentes religiosos uma organização política e da comunidade um pensar sobre qual é seu papel nesse processo.   
Sargento Regina – PDT – 1.328 votos
Dimas Carlos – PP –  573 votos
Pai Freitas – PHS – 221 votos
Macilei – PSL – 0 voto
Fonte: TRE-RN

 

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