O antropólogo Luiz Assunção,
professor da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte), também enxerga
na pluralidade a marca da jurema. É uma herança indígena que se misturou com
influências africanas e catolicismo popular.
A religião oficial, no entanto,
sempre condenou o catimbó como feitiçaria e culto demoníaco. Foi a semente da
perseguição policial contra seus praticantes e os da umbanda.
"A jurema sempre existiu
como prática ritualística, foi passando, passando, e chegou às populações
urbanas, mas a intolerância fez com que se fechasse como prática de pequenos
grupos em torno de um mestre vivo, em consultas individuais", diz o
antropólogo potiguar, autor do livro "O Reino dos Mestres: a Tradição da
Jurema na Umbanda Nordestina" (Pallas).
Para Assunção, a sobrevivência da
jurema teve a ver com o descaso do Estado perante os pobres das cidades
nordestinas. Sem acesso adequado a serviços de saúde, eles recorriam a
consultas com os mestres, grandes conhecedores de plantas medicinais, e a seus
"recados" mediúnicos.
"Existe um processo político
em torno de lideranças religiosas, que ganha forma nos encontros de juremeiros
realizados em alguns estados nordestinos, que remete à construção de
pertencimentos a partir da valorização de signos da tradição indígena."
A associação com a umbanda ganhou
força institucional nos anos 1960, quando começaram a surgir as federações
nordestinas dessa outra religião sincrética originária do Rio de Janeiro, na
qual entram orixás africanos, catolicismo e kardecismo.
Catimbozeiros e juremeiros se
abrigaram nas federações, nas quais viam uma promessa de proteção contra a
repressão. Abrigo que, afinal, não se concretizou –até hoje os terreiros sofrem
ataques, como ocorreu com o de mestre Rômulo.
Nesse processo, a jurema ficou em
posição subalterna, como um apêndice das casas de umbanda. O preconceito social
continuou forte. "Ainda hoje, a classe média não vai à jurema", diz
Assunção; quando muito, intelectuais se sentem atraídos pelo candomblé e sua
imagem de maior pureza africana.
Há um movimento de revalorização
do catimbó no meio urbano, contudo, em iniciativas como a de Rômulo Angélico, e
até mesmo um fluxo recente de catimbozeiros de Natal para São Paulo. Mas não é
só nas capitais nordestinas que suas práticas estão ressuscitando.
Fonte: Cultos com alucinógeno da
jurema florescem no Nordeste.
Marcelo Leite. Jornal Folha de São
Paulo, 29.jul.2022.
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