terça-feira, 30 de janeiro de 2024

Leitura

 


Mesa Fria: Sobre formas hiper-ritualizadas de alimentar no candomblé (Rio de Janeiro: Telha, 2023) é produto de pesquisa desenvolvida no contexto de estágio Pós-doutoral realizado no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, no período de 2021-2022, cujo tema versa sobre o complexo ritualístico da Mesa Fria, à comida e ao comer no candomblé. O autor, Patrício Carneiro Araújo, antropólogo, professor da UNILAB, babalorixá, filho de Oxóssi, conjuga suas experiências acadêmica e religiosa para, com cuidado, negociação e respeito acessar os rituais, proceder ao registro etnográfico e refletir sobre os significados da cultura religiosa, “sem ferir o princípio do segredo” guardado no âmago das religiões afro-brasileiras.

A Mesa Fria, conforme termo usado pelo povo de santo, se refere especificamente ao complexo ritualístico existente em algumas das expressões tidas como mais tradicionais dos candomblés jeje-nagô, ligado ao consumo de comidas votivas e ao gerenciamento do desperdício de alimentos intraterreiro, como nos ensina o autor.

O olhar atento do pesquisador vai ao encontro de um daqueles temas ainda pouco conhecidos no campo dos estudos acadêmicos afro-brasileiros, como é o caso da Mesa Fria, prática atualmente restrita a um número menor de terreiros, mantidas sob a guarda do segredo e, como ressalta o autor, parece existir uma retomada dessa prática religiosa. Além desses aspectos, é importante destacar que chama atenção de Patrício Carneiro o fato da prática da Mesa Fria estar ligada a um “modo próprio de gerenciar a preparação, circulação e consumo interno de comida, alimentando os membros da comunidade e evitando o desperdício”, afirmando a possibilidade de diálogo com práticas contemporâneas de consumo sustentável e saudável. Assim, ao procurar compreender o complexo ritualístico da Mesa Fria, prática religiosa inserida na tradição do candomblé, o autor constrói um fio de reflexões e análises, problematizando questões que dialogam com as mudanças da alimentação e dos modos de comensalidade  no mundo urbano contemporâneo.  

Ao ressaltar os autores clássicos da antropologia da alimentação no Brasil, o autor informa sobre um amplo campo de estudos na temática alimentação e das religiões afro-brasileiras, destacando como estes se colocam abertos para problematizarão de novas questões, indicando continuidades de pesquisas e estudos, como este sobre a Mesa Fria. Assim, ao propor em seu estudo uma perspectiva crítico-comparativa entre “as práticas alimentares percebidas em comunidade de povos tradicionais de terreiro e práticas alimentares contemporâneas próprias de grandes centros urbanos”, Patrício Carneiro dialoga com as perspectivas de autores contemporâneos, como a reflexão sobre as situações dos costumes alimentares (Claude Fischler), desritualização das refeições (Susana Inez Bleil), comportamentos alimentares hiper-ritualizados e as regras de pureza alimentar (Marta Francisca Topel), além de fazer uma leitura da teoria da ritualização (Erving Goffman) para aplicar aos estudos da Mesa Fria.

O presente trabalho prima por um rigor teórico e metodológico que está vinculado à cuidadosa leitura e análise dos diferentes autores com os quais procura dialogar e a uma ética na pesquisa, como já expressada anteriormente, sem esquecer-se da própria sistematização do trabalho de campo e recolha dos dados empíricos que inclui os processos de observações, entrevistas, registros fotográficos, etc., em um campo espacial que abrange terreiros de candomblé nas regiões metropolitanas de Fortaleza, Natal, João Pessoa, Salvador e São Paulo.

A leitura do livro Mesa Fria nos lembra a importância de se conhecer e compreender os saberes tradicionais próprios das populações de terreiro e, o ponto mais significativo, como a sociedade pode aprender com esses ensinamentos, com as suas concepções de mundo e natureza.  

São muitos os méritos do trabalho de Patrício Carneiro Araújo, agora editado em livro e que tive o prazer de acompanhar durante seu processo intelectual de produção. Por último, gostaria de sublinhar que a construção etnográfica do texto, tecido na trama das relações e na experiência vivida, no diálogo com a antropologia visual, em seu conjunto, texto, imagem e reflexão, faz a obra ganhar vida e importância.


Editora Telha – www.editoratelha.com.br

E-mail: contato@editoratelha.com.br

   


domingo, 21 de janeiro de 2024

21 de Janeiro - Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa

 

Intolerância religiosa é CRIME

Lei n.11.635, de 27 de dezembro de 2007.

    
    Campanha RN Sem Intolerância - 2012. 

     Grupo de Estudos Culturas Populares e Religiosidades-UFRN

     Arte: Marcos Queiroz.






quinta-feira, 18 de janeiro de 2024

O Encontro de Juremeiros e Juremeiras no calendário cultural da cidade do Natal

 

O ano começa com o VII Encontro de Juremeiros e Juremeiras, realizado no primeiro domingo de janeiro, no pátio da Fundação Capitania das Artes, que pode ser pensado como abertura do calendário público das comunidades tradicionais de terreiro de Natal.  

É muito significativo que mulheres e homens celebrem publicamente sua religião, em uma sequência que culmina com o atual sétimo encontro. Isto não é à toa. Estar no espaço público representa uma ação diferente da ideia historicamente conformada aos terreiros como espaços privados, escondidos, de invisibilidade dos cultos; representa poder estar no mundo externo ao terreiro, ocupar as praças, os centros culturais e demais espaços públicos; representa o direito de se expressar publicamente. Significa igualmente estratégia política para reconhecimento de suas práticas, combate ao racismo e a intolerância religiosa.  

O primeiro encontro, realizado em 2018, no Museu Memorial da Capoeira, no bairro de Cidade Nova, reuniu a família do Mestre Benedito Fumaça, sob a liderança de Pai Freitas, em uma programação que constou de comunicações e o toque de jurema.  O evento enuncia o tema “juntos seremos fortes” e a urgência do combate a intolerância. A semente tinha sido plantada e os frutos foram sendo conquistados.  

Mas para que os frutos brotassem foi necessário organização e articulação com instituições públicas, gestores e com as próprias comunidades de terreiro. O apoio recebido da Fundação Capitania das Artes foi decisivo para a mudança do local de realização do evento e implementação de outros elementos na programação. O toque e a gira de jurema será mantida como o momento principal do encontro, em que todos cantam e dançam em um longo círculo de energias. Na sequência dos encontros, pessoas foram sendo homenageadas e são incluídas as apresentações musicais, a feira de comidas típicas e de artesanato produzidos por pessoas das comunidades de terreiro. No encontro realizado no ano passado, um pé de jurema foi plantado no jardim da Funcarte.  

É possível afirmar que ao longo dos encontros um público mais amplo foi sendo incorporado, extrapolando àquele definido no primeiro encontro, agora advindos das demais comunidades de terreiro da cidade do Natal, região metropolitana e dos estados vizinhos, Paraíba e Pernambuco,  como também de pessoas da sociedade, inclusive turistas, não necessariamente vinculadas ao universo da religião. Igualmente importante, nesse campo de análise, é a presença de parlamentares do Partido dos Trabalhadores das três esferas do legislativo, como também as representações de coletivos e da militância ligada aos terreiros. 

Nos últimos encontros tem-se observado a presença de representantes das comunidades tradicionais indígenas do Estado do RN, politicamente muito importante para os dois segmentos – religioso e indígena, e, significativo pelo fato histórico e cultural da tradição indígena da religião jurema. 

Ao ser percebido pela comunidade religiosa como consolidado, o Encontro de Juremeiros e Juremeiras deve pleitear aos órgãos competentes sua inclusão no calendário cultural da cidade do Natal.

 

Memória iconográfica:



I Encontro de Juremeiros de Natal - 2018

Fonte: Portal Diário de Natal


Fonte: Fórum Estadual das Comunidades de Terreiro

Fonte: Fórum Estadual das Comunidades de Terreiro. Na foto, representantes do Coletivo GAMA, o Deputado Federal Fernando Mineiro e a Deputada Estadual Divaneide Basílio. 

Fonte: Fórum Estadual das Comunidades de Terreiro. Na foto, Deputada Federal Natália Bonavides.



 

segunda-feira, 8 de janeiro de 2024

Brasil, 08 de janeiro, não pode ser esquecido

 

que uma dor assim pungente

não há de ser inutilmente

a esperança dança

na corda bamba de sombrinha

em cada passo dessa linha

pode se machucar

 

(João Bosco/Aldir Blanc, O bêbedo e a equilibrista)

Arquivo Afro-Religioso

  Projeto de pesquisa e extensão do Grupo de Estudos Culturas Populares e Religiosidades (Departamento de Antropologia/PPGAS/UFRN), Grupo de...