Na sequência dos textos que formam o livro,
as reflexões sobre gênero e o que significa um corpo trans no universo do
terreiro movem Kallile Sacha da Silva
Araújo, yawó de Logunedé, na construção do texto A festa do mestre Cobra Coral como microcosmo para as negociações de
gênero de Dandara: um corpo trans na cozinha do terreiro. O tema ainda é
pouco trabalhado no campo dos estudos das religiões afro-brasileiras, inclusive
parece existir certo tabu, o que colabora para que as pessoas não se disponham
a falar, pelo menos foi uma das primeiras questões enfrentadas pela
pesquisadora em seu processo etnográfico. Ao longo do texto, conhecemos Dandara
(nome fictício, para preservar a interlocutora), 34 anos de idade, mulher
transexual praticante de candomblé e da jurema. Ao dar voz a Dandara,
conhecemos trajetos de vida, sonhos, alegrias, conflitos, à margem afetiva e
social, e a sua reinvenção no espaço do terreiro, como a interlocução
constituída na pesquisa nos leva a testemunhar o cotidiano vivido, os rituais,
as festas religiosas, a cozinha, local sagrado onde Dandara exerce seu domínio,
mas igualmente demonstra como nesse contexto o gênero se constitui ao se
acionar agência, símbolos, identidade, em um campo marcado pelas normas,
tradição religiosa, autoridade e poder estabelecidos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário