sábado, 31 de outubro de 2009

Discriminação na escola

O fato de discriminação denunciado pela professora de Macaé lembrou-me um outro ocorrido também numa escola pública, no bairro do Parque dos Coqueiros, aqui em Natal.


No período de 2001-2002 criamos o projeto de extensão “Cultura afro-brasileira nas escolas” chegando a mais de duas dezenas de escolas da rede pública da cidade de Natal. O projeto surgiu da constatação da falta de uma discussão mais ampla sobre questões que perpassam a temática. Assim, o projeto tinha como proposta desenvolver ações culturais que venham contribuir para ampliação do universo educacional do alunado, como também o conhecimento de questões atuais sobre a inserção da população negra na sociedade brasileira: a discriminação, o patrimônio cultural, a identidade. O projeto pretendia ressaltar a presença da cultura africana entre os brasileiros, em especial no RN, e sua importância na formação da sociedade.


A escola do Parque dos Coqueiros foi uma das selecionadas e durante uma semana estivemos naquele espaço escolar com uma série de atividades que incluía entre outras: uma mostra fotográfica sobre danças folclóricas e encantaria, exposição dos trabalhos realizados pelos alunos em diferentes atividades, exposição de objetos de rituais da religião candomblé e umbanda, projeção de filmes e documentários, oficinas de discussão temática, palestras, oficina de literatura infantil, apresentação de grupos folclóricos.


Lembro que logo de início algo me chamou atenção e que depois percebi se repetir em todas as escolas: o fato de algumas professoras não se envolverem com a programação, nem tampouco incentivavam seus alunos a participarem, ao contrário, era muito perceptível que alguns alunos não participavam como no exemplo da exposição de objetos rituais, eles chegavam até a porta da sala, sempre faziam alguma observação negativa, mas não entravam na sala.


Um ano depois de encerrado o projeto tomo conhecimento de que em uma atividade conjunta realizada pelas professoras de português e artes, envolvendo leitura, escrita, desenho e pintura, uma das crianças desenhou e denominou de orixá Exu. No espaço da sala-de-aula nada aconteceu. O problema foi ao expor os trabalhos dos alunos na biblioteca da escola. Ao ver o desenho de Exu exposto, a bibliotecária não concordou porque, em sua versão, se tratava de coisa do demônio. Não sendo possível retirar o desenho da exposição à professora bibliotecária resolveu incitar as outras crianças da escola a tratar o aluno como portador do próprio demônio, “macumbeiro”, entre outras denominações estigmatizantes e discriminatórias, expondo o aluno a situações cada vez mais constrangedoras, uma vez que passou a ser alvo de gozação, por parte dos seus colegas, no cotidiano da escola.


A Federação de Umbanda e Candomblé do RN tomou conhecimento do fato e foi até a escola conversar com a direção, no entanto nenhuma medida efetiva foi tomada. Os pais do aluno que fez o desenho do Exu foram obrigados a pedir transferência para outra escola.


A fotografia foi feita durante a realização do Projeto na Escola Municipal Terezinha Paulino, bairro do Parque dos Coqueiros, em Natal/RN, 2001.

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